Segunda, 15 Março 2010

Estado vê dificuldade em realizar adoções

Juizado da Infância e Juventude diz que busca por perfis idealizados impede que muitas crianças encontrem um novo lar para viver

Imagine-se criança novamente, porém sem um colo aconchegante de mãe e um afeto inabalável de pai para trazer-lhe segurança. Junto a isto, imagine-se também portador de uma oportunidade de reverter este quadro, entretanto isto depende de aprovações estéticas e de faixa etária, tudo para que, mesmo que de outras figuras maternas e paternas, você pudesse ter acesso ao que lhe é, até então, inacessível: uma família. O que aqui é uma simulação, no Tocantins é a realidade de diversas crianças que, amparadas legalmente após a desvinculação com os pais biológicos e prestes a se tornar passíveis de adoção, sonham com a possibilidade de ser adotadas e ter a chance de viver em ambiente familiar, mas são privadas disto devido aos perfis estabelecidos pelos interessados em adotar.

Atualmente, segundo informações da Comissão Estadual Judiciária de Adoção (Ceja), o Tocantins possui cerca de 44 pretendentes a adotar, que podem ser casais ou indivíduos. Porém a maioria deles traça perfis de idade, cor de pele, histórico familiar e outras características que, geralmente, fogem às das crianças que dependem de algumas definições legais para se tornar adotáveis (não há números acerca deste público) no Estado. Para se ter uma ideia somente na Casa Abrigo Raio de Sol, em Palmas, há 21 crianças passíveis de ser adotadas. Ou seja, desta maneira, o processo adotivo termina desprestigiando as crianças em situação desfavorável em detrimento da busca pela auto-satisfação por parte daqueles que se dizem interessados em adotar alguma, conforme afirma a assistente social forense do Juizado da Infância e Juventude da Comarca de Palmas Márcia Mesquita.

“Os pretendentes, geralmente, buscam meninas brancas, recém-nascidas, sem histórico de doença na família, enquanto a maioria das crianças aptas a ser adotadas já tem anos de vida, são negras e, às vezes, com um histórico desfavorável de doença. Com isto, gera-se uma carência para o tipo de demanda. O ideal é que certas vaidades sejam deixadas de lado e que se encontre o equilíbrio entre os anseios dos interessados e os das crianças.”

De acordo com a juíza da infância e juventude Silvana Maria Parfienkiuk, isto ainda ocorre pela falta de consciência de muitos que buscam adotar sobre o real papel desta ação, que não pode, de forma nenhuma, ser entendida como caridade. “A adoção deve ocorrer por desejo consciente, por motivação maternal e paternal, e ela envolve perdas e ganhos, assim como quando temos filhos biológicos”, explica. Para Silvana, adotar significa mudar destinos, tanto dos pais quanto das crianças.

Como o público interessado em adotar é muito variável, conforme explica a psicóloga da Juizado da Infância e Juventude da Capital Luciane Rodrigues do Prado Leão, no momento de selecionar os aptos a realizar a adoção, vários métodos são utilizados para se romper estes paradigmas. “Nós entrevistamos solteiros, casados, com filhos, sem filhos, ricos, pobres, ou seja, diversos tipos e várias subjetividades. Para mudarmos a concepção do ‘filho perfeito’, nós conversamos de forma franca, mostramos que a criança que virá deve ser recebida de forma natural, através de uma escolha mútua, sem envolver perfis pré-determinados.”

Números

Pretendentes a adotar uma criança: 44
Número de crianças passíveis de adoção só na Casa Abrigo
Raio de Sol: 21
Saiba mais

Acolhidas
Segundo a Comissão Estadual Judiciária de Adoção (Ceja), apenas quatro instituições abrigadoras estão cadastradas no sistema de entidades de acolhimento no Tocantins.

Casa Abrigo Raio de Sol, em Palmas
Casa de Acolhida, em Palmas
Casa de Passagem Criança Cidadã, em Guaraí
Lar Batista F.F.Soren, em Itacajá