Nota pública: palestra sobre sexualidade na ETI Anísio Teixeira

Os movimentos sociais e organizações, no exercício da função de controle social e da defesa de direitos da criança e do adolescente, externam preocupação sobre a condução, a repercussão e reverberação de palestra sobre educação sexual, ministrada no marco do projeto “E Agora”, na ETI Anísio Teixeira, no município de Palmas/TO, sobretudo à vinculação e leitura dos fatos a partir de interesses pessoais, partidários e religiosos, levando à incitação ao ódio, à identificação, à criminalização de responsáveis, numa verdadeira “caça às bruxas”, prática ocorrida na era medieval da qual nos envergonhamos e queremos esquecer.

Notadamente, a condução deste processo tem causado um desserviço ao avanço do direito à educação, pois se utiliza do aparato estatal para manutenção de estigmas e preconceitos. Este processo confunde as famílias e a sociedade, reduzindo o protagonismo social, educacional e político das crianças e adolescentes, tirando o foco do seu interesse superior, da sua autonomia e do seu desenvolvimento na perspectiva ampla e integral.

É inevitável e indispensável o debate de assuntos considerados tabus pela sociedade em todos os espaços, inclusive na escola. A educação como responsabilidade da família, do Estado e da sociedade, deve ter alcance pleno e emancipatório, devendo ser livre de preconceitos e discriminações, como determina a Constituição Federal. Neste sentido, este coletivo de movimentos sociais e organizações é absolutamente favorável à educação sexual nas escolas e, para além disso, ao debate sobre gênero, diversidade, racismo e orientação sexual.

A escola não é o local apenas da transmissão de conhecimento, mas de formar o/a estudante/a em todos os campos da dimensão humana, preparando para a vida, para o respeito à tolerância, às diferenças e às pluralidades. A educação deve se voltar ao pleno desenvolvimento da pessoa, da cidadania, senso crítico, emancipação e autonomia. Sob essa ótica, a escola jamais pode ser espaço de repressão, pois somente tendo informação é que crianças e adolescentes podem se proteger de diversas formas de violência.

Neste bojo, consideramos ainda um retrocesso que o Plano Municipal de Educação tenha sido alterado com a vigência da Lei nº 2.243/2016, contestada pela ADI 0011990-05.2016.827.0000/TO, dando margem para que o assunto da educação para a diversidade não seja tratado nas escolas, tirando das crianças e adolescentes direitos já conquistados. Por óbvio, tratar de tais temas não implica influenciar, praticar doutrinação sobre o assunto ou introduzir práticas sexuais. Significa ajudá-los/as a compreender a sexualidade e protegê-los/as contra a discriminação e a violência.

Promover a igualdade de gênero não significa anular as diferenças percebidas entre as pessoas (o que tem sido amplamente distorcido no debate público), mas garantir um espaço democrático onde tais diferenças não se desdobrem em desigualdades.

É preciso direcionar urgentemente todos os esforços para questões centrais que envolvem o direito à vida de adolescentes como: a violência física, psicológica, e a negligência no ambiente familiar, a violência sexual, automutilação, bullying, gravidez indesejada na adolescência, doenças sexualmente transmissíveis/AIDS, discriminação, racismo e suicídio dos jovens.

As famílias passam sozinhas por todas estas questões sem qualquer apoio do poder público, pois não há uma agenda pública intersetorial para prevenção e enfrentamento destas ameaças e violações de direitos. Esses últimos acontecimentos vão contra todos os avanços conquistados no campo dos Tratados e Convenções Internacionais, como Declaração Universal dos Direitos Humanos, o Pacto de San José da Costa Rica, Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, Princípios de Yogyakarta, das quais o Brasil é signatário, e ainda, a decisão liminar do Ministro Luís Roberto Barroso na ADPF nº 461.

Defender tais avanços, para além do aspecto legal, é obrigação de todos/as que se preocupam com o atual cenário nacional, permeado por um clima de policiamento e perseguição da expressão das liberdades individuais e defesa de direitos.

Subscrevem essa nota:

Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e Adolescente
Associação Padre Josimo
Associação Tocantinense de Conselheiros Tutelares – ATCT
Centro de Defesa de Direitos da Criança e do Adolescente – Cedeca Glória de Ivone/TO
Centro de Direitos Humanos de Palmas (CDHP)
Coletivo Kizomba
Coletivo Lesbitoca
Coletivo Nacional de Juventude Negra – Enegrecer
Coordenação de Mulheres do MAB/TO
Conselho Regional de Serviço Social do Tocantins (CRESS)
Consulta Popular Tocantins
Levante Popular da Juventude Tocantins
Marcha Mundial das Mulheres – Núcleo Lélia Gonzalez
Movimento Estadual de Direitos Humanos – MEDH/TO
Núcleo de Estudos, Pesquisas e Extensão em Sexualidade, Corporalidades e Direitos – UFT
Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares no Tocantins - Renap/TO

24 de novembro de 2017
Palmas - Tocantins